Evento anual de Design Thinking na educação realizado na Califórnia, fala de disrupção no conteúdo e na organização e evidencia o desgaste dos formatos tradicionais
Por Priscila Gonsales
Imagine reunir mais de uma centena e meia de educadores em um único evento cujo tema é “desenhando o futuro da educação” de forma que todos participem de tudo e ainda ponham a mão na massa. Ah, simples, você deve ter pensado. Basta um grande auditório com uma série de palestras interessantes e, para a parte prática, é suficiente ter algumas salas de painéis ou oficinas simultâneas para o público escolher o que quer ver. E, claro, não vai ser possível ver nem participar de tudo e a interação se dará por meio de perguntas e respostas.
Pois é exatamente isso que o Big Ideas Fest (BIF) não é. E é exatamente por isso que eu gostei tanto dele. Na verdade, me encantei. E muito. Desde que trouxemos a abordagem do Design Thinking (DT) na educação para o Brasil, em 2014, venho pensando em promover um evento que possa reunir pessoas que já estejam desenvolvendo metodologias diferenciadas usando o DT nos processos dialógicos de ensino e aprendizagem e, com isso, provocando inovação.
Digo e ressalto o verbo “provocar”, pois inovação não se lança nem se cria. Inovação acontece. Acontece a partir do momento em que um determinado projeto, modelo ou processo se torna valoroso na vida das pessoas. Para o DT, inovação é valor percebido. A solução trouxe alguma melhoria? Seja ela emocional ou cognitiva, o ganho para as pessoas envolvidas precisa ser nítido.
Para quem ainda não conhece o DT, estamos falando de um novo jeito de pensar e abordar problemas ou, dito de outra forma, um modelo de pensamento centrado nas pessoas. O BIF, realizado de 2 a 5 de dezembro, em San José/Califórnia, já começou com algo bem diferente do que normalmente é esperado. Deu as boas-vindas no hall de entrada, com todos em pé. Antes de entrar no grande salão, os participantes tiveram que compartilhar, com pessoas que não conheciam, suas inspirações do ano e construir flores com garrafas pet e papéis coloridos para pendurar seus desejos de aprendizagem durante o evento.
No grande salão, mesas redondas enormes para dez pessoas – incluindo estudantes do Ensino Médio, sim eles participaram igualmente das atividades – se distribuíam como se fosse uma festa (e era!). No palco, alguns revezamentos de falas no formato TED, curto e direto ao ponto-problema, claramente preparadas para trazer entusiasmo e incentivo e protagonizadas por pessoas que tem de fato a prática do que estavam relatando, só para citar alguns deles:
– a diretora de escola Jacqueline Sanderlin, que conseguiu criar e manter uma comunidade ativa de parceiros da escola, desenvolvendo ações de cultura e arte;
– a estudante Kyleen Majkowski, que criou, aos 7 anos, uma plataforma para crianças de 7-11 anos aprenderem princípios do empreendedorismo;
– a cofundadora do Fundo Malala, Shiza Shahid, que ajudou a ativista paquistanesa e prêmio Nobel, Malala Yousafzai, a construir uma instituição que arrecada recursos para garantir estudo a todas as meninas paquistanesas;
– o professor Tyson Mustafa, que deu aulas para jovens e adultos encarceirados.
Em seguida e nos intervalos das falas, o BIF promoveu o que há de mais interessante: a “pegada maker”. Os grupos de participantes tinham que pensar propostas educativas para combater um dos problemas mais sérios na educação norte-americana, o que eles chamam de “school-to-prision pipeline”, termo usado para se referir às práticas chocantes e repressivas da polícia nas escolas públicas do país, que chegam a colocar crianças em reclusão em salas fechadas. A proposta era identificar oportunidades no problema, quem são e qual a realidade desses alunos e, num primeiro momento, vislumbrar soluções “óbvias e imediatas”. Mas depois, avançando um pouco, buscar soluções que de fato pudessem ser inovadoras.
As produções dos grupos foram trabalhadas em oficinas no período da tarde, em várias salas, todas com um facilitador que conduzia o processo de DT, ou seja, mesmo separados, os participantes estavam alinhados no mesmo processo. Assim, nos momentos conjuntos, na grande sala, podiam apresentar e compartilhar as produções. À noite havia também programação: rodas de conversa, jogos de tabuleiro, exibição de filmes etc.
Merecem destaque a forma como foi facilitada a criação do storytelling para representar, empaticamente, a pessoa a ser beneficiada, e também a construção do protótipo da solução a partir de atividades corporais e lúdicas intermediando as escritas nos post-its e a preparação das maquetes.
O Big Ideas Fest é organizado anualmente pelo ISKME, uma organização não-governamental fundada pela educadora Lisa Petrides, nossa conselheira consultiva no Educadigital, e uma das maiores especialistas do mundo em educação aberta e uso do Design Thinking na educação. Em sua primeira edição, há 7 anos, quando não havia nem TED nem SXSWEdu, o BIF já se configurava como um evento de potencial altamente inovador por ser “maker” e propiciar que alunos e educadores pudessem juntos vivenciar a proposta. E continua sendo! Já estamos conversando para fazer o Big Ideas Fest Brazil!
😉
Mais informações: http://www.bigideasfest.org/
Para ver como foi a cobertura nas redes sociais, busque a hastag #BIF2015
Veja mais fotos aqui: http://migre.me/soCKz